Galápagos – Uma abordagem psicológica

23/12/2023

Galápagos – Uma abordagem psicológica

As fotos a seguir não servem para compor um portifólio e tampouco  retratar a beleza do fundo do mar. O objetivo é somente contextualizar em algumas imagens o que significa  mergulhar em Galápagos.

Um mergulho diferente de tudo que já tenha imaginado. Vá pronto para descartar os conceitos básicos que aprendeu sobre realizar um mergulho dentro dos padrões de segurança: “planeje o mergulho e mergulhe o planejado; mergulhe dentro da sua zona de conforto; não toque no fundo; evite mergulhos extenuantes”… Se segui-los à risca, não vai mergulhar naquele arquipélago!!

 

 

Sem falar do cuidado com seu equipamento, de mergulhar no trim, descer devagar,  não tocar encostar no fundo e não tocar em nada durante o mergulho, manter o padrão respiratório correto…. Esqueça tudo isto caso queira fazer, sem dúvida alguma, um dos melhores mergulhos de sua vida!  A única previsibilidade de cenário é que os mergulhos serão alucinantes. E difíceis!!!

Depois de uma semana em Galápagos aprendemos na marra o desapego pelo equipamento e abandonamos a ilusão de um perfil de mergulho tranquilo. Aqui é raiz!!! Como diria uma mergulhadora de nosso grupo:

– Água fria, correnteza absurda, visibilidade ruim, mar batido, a gente se agarrando no fundo entre as cracas, destruindo o equipamento, mamando o ar do cilindro, coração disparado e que mergulho do c*#%!, o melhor do mundo!!

No laboratório de Charles Darwin a vida pulsa intensamente! Nada aqui é previsível ou morno. O eletrocardiograma define bem nossas emoções antes e depois de cada mergulho. Os briefings não são reconfortantes, muito antes pelo contrário. Nos preparamos para condições oceânicas extremas e esperamos que a vida selvagem abaixo da linha dágua nos recompense por toda adrenalina descarregada na corrente sanguínea e nas correntes marinhas . Enebriados e anestesiados, é visível a  felicidade transbordando após cada imersão! Descidas muito rápidas e logo após nos agarramos ao fundo do jeito que desse, um mundo se descortinava à nossa frente: tubarão baleia, tubarão martelo, móbulas, chitas, golfinhos, washing machine, arremessos no meio do azul, a favor e contra fortes correntezas, palpitações em meio a tubarões que por vezes vinham nos investigar…  De repente não podíamos mais nos ver em meio a densa cortina gigante de salemas que só abria espaço para lobos marinhos que vinham se deleitar do banquete e acabavam perdendo o foco da refeição. Brincar conosco é muito mais divertido que almoçar… Crianças são crianças em qualquer lugar ☺

 

 

Em meio a tanta imprevisibilidade deixamos de lado, pouco a pouco, nossas armaduras. Da nossa terra natal, daquele ambiente no qual ditamos nossas próprias regras e orquestramos nossas ações, não sobra nada. Seguir cegamente as normas do profissional local que acabáramos de conhecer, cumprir à risca tudo o que é dito sem questionar vírgula, faz com que qualquer resquício de nossa auto suficiência fique em terra. Naquele ambiente, destreza e confiança são base de sobrevivência. Precisamos confiar em nós, no guia e no dupla. Silenciosamente, a cada submersão, estreitamos nossos laços. Ficamos mais próximos individual e coletivamente.

A cada dancinha pós mergulho, a cada mentira contada para o grupo da outra “panga”, a cada roxo trazido para superfície depois de alguns impactos nas pedras e nos sorrisos cada vez mais estampados nos lábios roxos de frio, nos sentíamos mais e mais inteiros.

Uma viagem de mergulho tem o poder de nos arremessar à infância. Voltamos a quinta série, implicamos uns com os outros, pegamos muito no pé, analisamos o jeito de ser de cada e traçamos estratégias para avacalhar o sistema de funcionamento do coleguinha. Vale tudo para tornar a viagem mais divertida. Ao sermos obrigados a viver por 5 dias sem telefonia ou internet, os dias passam mais lentos e muito mais intensos. Rimos, choramos e nos mostramos por inteiro. Ao nos expormos assim por completo, hora expandimos, hora recolhemos. Fazemos confidências, falamos nossas verdades,   ouvimos outras verdades que não as nossas. Trazemos ao nosso prisma um pouco da perspectiva do outro. Se no início alguém quer ter razão, ao final de uma viagem assim somamos nossos pontos de vista e está tudo certo. É simples, mas não é fácil.

 

 

 

As habilidades que nos são necessárias embaixo dágua passam a ser essenciais durante nosso convívio na superfície. Num mergulho, a perda de contato visual do dupla pode ser motivo de choro imediato e encerramento do mergulho. O medo da perda trás a desconstrução de sermos fortes sempre  e o transbordo dos sentimentos particulares demonstra o que não vem em palavras . Nos expomos de novo e ao aceitarmos que sim, podemos sentir medo, ficamos menos rígidos conosco e com os demais. E daí ficamos mais inteiros!! Praticamos a empatia, aumentamos nossa sensibilidade.   

 

Particularmente, durante os dias em Darwin e Wolf fiquei introspectiva…. A carga de responsabilidade trouxera uma dose maior de ansiedade. Mas a turma esteve muito coesa e até os colegas holandeses entraram na brincadeira: carreta furacão, mola mola, la reina, leviana e alguns outros predicativos que não convém mencionar já eram parte de nosso vocabulário. Tudo isto a 1.100 km do continente, no meio do nada e em meio a vida mais abundante que poderíamos presenciar. 

 

 

Na teoria da evolução, também nos adaptamos enquanto estivemos por lá. Que esta adaptação evolutiva nos acompanhe por dias, semanas e até mesmo por todo ano de 2023. De volta à nossas vidas em terra firme as lembranças nos acompanharão até… até a próxima viagem!!!!

 

 

 


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